Como jogos de futebol impactaram minha vida
- Matheus Maranho
- 20 de jul. de 2023
- 10 min de leitura
Talvez essa leitura mude a sua percepção sobre jogos de esportes no geral.
Vinte e três anos atrás, minha história já tinha alguns capítulos escritos, e mesmo não sendo uma quantidade grande de tempo o futebol já permeava essas linhas.
Onde tudo começou
Você que é mais jovem deve estar se perguntando: "Que diabos é isso?". Essa incrível imagem acima, nada mais é do que um belíssimo clone do consagrado Internacional Super Star Soccer para Super Nintendo, um dos jogos de futebol mais difundidos no Brasil daquela época. Tenho uma lembrança muito clara a respeito desse carinha. Entro pela porta principal na casa de minha bisa e dou de cara com meu primo, meu tio e meu avô vidrados num incrível televisor de tubo, 29 polegadas. Logo minhas antenas foram se levantando aguçadas pela curiosidade, "o que será que eles estão vendo?". Ainda sem ver muita coisa, vou chegando mais perto da televisão e me deparo com a seguinte cena:
Eu mal conhecia o que era o futebol, mas por conta deste jogo fui introduzido nesse universo. Ao iniciar uma partida/exibição simples, uma interface de seleção com inúmeros times é exibida ao usuário. Lá estava ele, o time do povo, meu saudoso Corinthians. Ainda sem saber o tamanho da representatividade do time, ou que meu amado pai seria mais um do bando de loucos, o escudo imponente e as belas cores já me despertaram uma sensação de euforia.
Após as escolhas dos times, estava na hora de definir os embates, é ai que a história realmente começa. Papel e caneta na mão, par ou ímpar e os campeonatos estavam formados. Os jogos iniciavam, as "provocações" dos jogadores enquanto estavam na frente do placar eram constantes e as chaves de confronto iam sendo diluídas até o confronto final.
Paixão à primeira vista
Hoje todos conhecem o amado Playstation 1, principalmente a proporção e o impacto do mesmo no nosso país. Mas na época, eu sequer tinha ideia de sua existência e não tinha qualquer console, meu único contato com os vídeo games era apenas por parte de meus familiares. Natal se aproximava, e eu como qualquer criança adoraria ganhar presentes, principalmente brinquedos mais tradicionais, o que eu realmente não esperava era ganhar um Playstation!
Na noite de natal em específico, comecei a abrir alguns pacotes e as pessoas presentes me pediram pra deixar uma caixa maior por último, dito e feito, assim o fiz. Ao abrir, um lindo vídeo game me esperava já destravado e com alguns jogos inclusos. Dentre esses discos, me deparo com a capa anexada acima, o personagem na arte vestia um uniforme que aparentava ser de um time de futebol. Um alerta a lá Snake (Personagem da saudosa franquia Metal Gear) pairou sobre minha cabeça, instantaneamente me aprontei e liguei o nosso monstrinho cinza. Insiro o disco e espero ansiosamente pelo que está por vir. Assim como no Ronaldinho Soccer, escolhemos uma partida de exibição tradicional, e ao escolher os times que eu desconhecia completamente, uma tela de carregamento começa o processamento para iniciar a partida. Loading realizado, um campo de futebol completamente 3D é exibido na tela, a partida se inicia após o start no controle e a animação dos jogadores entrando em campo era perfeita, nunca tinha visto nada igual, era lindo. Noite adentro, mesmo sendo um pequeno gafanhoto, nada mais justo do que um campeonato com meus familiares.
Poderia discorrer por muito tempo sobre as maravilhas que esse jogo me proporcionou, master league, copa do mundo, várias jogatinas com meus familiares, personalização de elencos, meu novo conhecimento sobre times internacionais, mas o foco não é esse, então vamos seguir.
A primeira copa do mundo
Como o encarte já nos indica, o ano era 2002, eu jamais havia presenciado tamanha euforia pelas pessoas de um modo geral, era contagiante. Todos vestiam algo que lembrava a bandeira de nosso país, o início da competição era só em Maio mas desde o começo daquele ano a emoção já aflorava na população.
Até então eu nunca havia acompanhado uma competição desse tamanho tão de perto, o mundo todo reunido torcendo para seu respectivo país, todos sendo um só. Ruas pintadas, bares decorados, veículos adesivados, o assunto era sempre o mesmo na vizinhança.
É chegado o momento, meses se passaram até o ponta pé inicial do Brasil na fase de grupos, nosso primeiro desafio estava diante de nossos olhos e se chamava Turquia.
Jogo ganho, agora era aguardar o próximo adversário ansiosamente. Nesse meio tempo, eis que meu querido tio chega com um capa de CD fina, translucida e cor de rosa. Eu não podia acreditar, era lançado um novo Winning Eleven, o 2002.
Minha reação foi automática, abrir o menu e iniciar uma copa do mundo com o mesmo chaveamento da que estava rolando. Um verdadeiro deleite, horas a fio de jogatinas, novas customizações, novos estádios, novos times, novas bolas, era mágico.
Se não a melhor, uma das melhores experiências com jogos de esporte que eu já tive em toda vida.
Mudança de geração
Transitando entre os jogos citados , o tempo foi passando mas a magia continuava. Mais capítulos eram escritos na minha história sem deixar o futebol de lado, era um fiel escudeiro, sempre ao meu lado. A partir daí, um pouco mais velho, começo a frequentar com meus tios, pai e avôs a saudosa Santa Efigênia localizada em São Paulo, para os que não conhecem um paraíso dos eletrônicos.
Passando pelas lojas e observando atentamente cada detalhe, não conseguia pescar muita coisa, a estatura na época não ajudava. Quando o passeio estava quase acabando, um de meus tios fez o seguinte comentário: "Vocês viram o Playstation 2?". Essa pequena frase foi o suficiente pra acender uma fagulha de esperança. "Será que vamos comprar? Devo pedir um para os meus pais? Qual é o preço?".
Bom, saímos sem um novo console de lá, vida que segue. Passado mais um tempo, havia dado uma pausa nas jogatinas por conta dos estudos e nem havia notado, mas meu Playstation 1 não estava mais lá. Procurei por todos os cantos e não encontrei, minha última alternativa era perguntar aos meus pais sobre o paradeiro. A resposta não foi boa: "Vendemos!". Desolado, fiquei sem entender muito bem do porque mas tudo bem, nossos pais querem o nosso melhor e sabem o que fazem, não questionei.
Meu aniversário estava próximo, a ideia era pedir meu querido Playstation de volta. Conversei com meus pais e aparentemente tive um sinal positivo de resposta, a princípio teria o xodó de volta. Chegava então o grande dia, a excitação era grande, era meu aniversário. Sem muita comemoração, apenas uma festinha simples na casa de minha avó com as pessoas que amo. Apesar de não ter ganho presentes físicos e ter de certa forma me chateado, o amor dos meus familiares já era o bastante pra suprir qualquer capricho.
Eis que na manhã seguinte avistei uma caixa azul no centro da sala de casa, não haviam muitos escritos na parte frontal apenas duas letras e um número: "PS2". Era uma miragem? Todas as peças se encaixavam, meus familiares se empenharam para me proporcionar tal alegria. Eu não podia acreditar, caí aos prantos sobre a caixa, apenas dei um grande abraço em meus pais e disse o quanto os amava.
Vamos aos fatos, a caixa já estava aberta e junto ao console pude ver uma embalagem, essa mais robusta do que a da geração anterior, com um manual maior e com um case para memory card. O jogo vocês já devem imaginar, Winning Eleven, só que desta vez era a sexta edição.
Um verdadeiro divisor de águas na minha humilde opinião. Gráficos com maior polimento e nitidez, era possível ver as expressões faciais de cada jogador, novamente uma nova gama de possibilidades sobre customizações, aumento de complexidade na nossa incrível liga master, times clássicos ao realizar feitos específicos, um supra sumo!.
Acredito que nesse título em específico foi onde mais alimentei meu vínculo afetivo com meu pai. Diversas histórias partilhadas, risadas, momentos memoráveis e é claro muitas partidas jogadas. Por mais que a premissa fosse jogar, o aprendizado era contínuo, aqui eu já adentrava na adolescência e ia acumulando experiências, não só com meus familiares, mas um novo ciclo surgia cheio de novas amizades. Pra variar, ciclo esse recheado de Winnig Eleven, diversos campeonatos, times personalizados com os nomes dos amigos, saves de master league compartilhados, anotações sobre vitórias/derrotas para cada colega, reuniões com comes e bebes, discussões sobre qual o melhor esquema de jogo e etc.
Nos dias atuais ainda jogo este game, não mais através do maravilhoso Playstation 2 mas a experiência continua a mesma, é de um prazer inenarrável carregar todas essas memórias e as transpor para o controle no momento de jogar. O Sentimento continua.
O que já era bom, ficou ainda melhor
Winning Eleven 10, para outros Pro Evolution Soccer 6, um verdadeiro marco para os jogos de futebol. Praticamente uma unanimidade entre a comunidade, aqui não existem apenas traços de mudança, mas sim uma reformulação completa. Aqui uma nova engine foi utilizada, mas o foco principal de mudança foi na movimentação dos jogadores. Chutes, dribles, toques, lançamentos, defesas, desarmes, tudo acontecia com tamanha fluidez e precisão, muito próximo a realidade, tido por diversos portais, revistas e comunidades como o melhor simulador futebolístico já lançado.
Além das qualidades já citadas, tínhamos mais ligas, times, jogadores, bolas, chuteiras e estádios licenciados. Não poderíamos deixar de lado, nesse mesmo período uma febre tomava conta de nossos vídeo games, uma histeria entre os boleiros, o amado bomba patch. Juntávamos todas essas inovações com nossos queridos editores que nos proporcionavam tamanha alegria fazendo adições de diversos times e ligas nacionais, tudo que qualquer amante de futebol deseja na sua hora de lazer, aproveitar o máximo de sua paixão com seu time de coração.
Minha cópia em específico era um "simulacro", se é que você me entende, o homem médio brasileiro em quase toda sua totalidade não consegue despender um valor estratosférico para com seu lazer ou caprichos, esse talvez seja um possível tema futuro para abordarmos.
Deixando a realidade de lado, me lembro bem desse incrível momento, cheguei até a casa de meu tio, a ideia era dormir por lá o fim de semana todo. Assim que adentrei ao apartamento, a capa com um simples encarte impresso desbotado estava apoiada a frente do televisor. Jantar concluído, partimos pras partidas, que noite proveitosa! Nada melhor do que estar com quem se ama e compartilhar do mesmo sentimento sobre algo, definitivamente marcante. Posso dizer que neste caso as interações foram maiores do que as versões anteriores, casa de amigos com muita frequência, muitas partidas com meu pai , campeonatos em locadoras e novas amizades, tudo isso graças ao futebol.
Tempos sombrios
Passamos por mais uma mudança de geração, 7° no caso, essa que teve seu início em 2005 pra ser mais exato. A era online começava, chat de voz com outras pessoas, campanhas cooperadas, partidas competitivas, troca de mensagens e muito mais. Uma nova gama de jogos que enchiam os olhos e poderiam ser aproveitados com muito mais empenho, eram maiores e complexos, novas abordagens estavam sendo inseridas no mercado a fim de conquistar novos públicos, cada vez mais os vídeo games se consolidavam no mundo.
Um novo reinado surgia no mundo do futebol eletrônico, era a vez do FIFA tomar à frente e se consagrar no mercado nacional. Visual estonteante, engine ultrarrealista para os padrões da época, campeonatos on-line. Até aqui tudo certo com os jogos, a cada nova edição as pessoas aproveitavam mais, contudo, na chegada do FIFA 12 ao mercado as coisas começaram a "ruir" no meu ponto de vista, era a introdução ao modo ultimate team. Modo esse completamente customizável, compra de técnico, preparamento físico, jogadores de ligas mescladas, habilidades para alavancar o desempenho do time. Tudo isso funcionando através de um "mercado" ao vivo, onde outros jogadores poderiam listar e negociar os bens de seu clube. A sensação inicial era de revisitar uma master league mais genérica, só que ao invés de ser local estaríamos competindo ao redor do globo. A primeira vista um conceito muito legal e atrativo, mas a longo prazo extremamente danoso pra todos. Não posso dizer que não houve proveito, pelo contrário, talvez tenha sido o período em que eu mais tenha jogado. Mas aqui chegamos no ponto central em que as coisas começam a desmoronar. Tentar conseguir mais moedas para aprimorar seu time, seja comprando e vendendo cartas por um longo período de tempo, ou jogando cada vez mais para avançar nas categorias e premiações. Confrontos com microfone aberto onde o foco deixava de ser a diversão e acabava chegando aos xingamentos por não querer perder, uma irritabilidade sem tamanho tomava conta das pessoas a cada nova partida.
Utilizar seu dinheiro(além do valor para o jogo base já gasto) para comprar pacotes que na teoria deveriam lhe dar alguma recompensa, mas que na verdade são um sistema de cassino com uma certa porcentagem de sucesso. No final só restava o vício, o foco deixava de ser o divertimento e a interação com mais pessoas ao seu redor, não era mais um momento prazeroso de lazer, simplesmente se tornou uma competição. Nos dias atuais as empresas continuam seguindo o mesmo modelo de negócio, e aqui não posso descredibilizar o trabalho, afinal o intuito de um empresa é gerar riqueza, mas quando o assunto é entregar uma experiência que esteja alinhada com sua base de jogadores, as mesmas falham miseravelmente apenas por mirar no lucro. A real mudança está no equilíbrio dessas ações, entregar o melhor e mais completo pra que o valor pago seja justificado, assim os jogos não causariam uma sensação de frustração pra maioria das pessoas.
O que restou foi saudade
Atualmente os modelos dos jogos de futebol não me agradam mais, as alternativas são sempre os emuladores, você deve estar pensando: "Mais isso ai é preciosismo, você parou no tempo e talvez só esteja interessado na sensação de nostalgia que os outros jogos te causam", em parte eu concordo e por outro lado não. Como já dito, o intuito final das empresas e visar o lucro deixando a melhor experiência de lado, não posso ser generalista, estamos discorrendo sobre jogos de futebol, quiçá de esportes como um todo. Ainda temos coisas interessantes dentro desse meio, mas que ainda não são o suficiente para me sugar de volta pra esse universo. Hoje já não tenho mais contato com os amigos que partilhava as experiências passadas, a vida adulta nos força a focar em outros assuntos, perdi entes queridos e não consigo mais jogar com meu amado pai por falta de tempo, e aqui é onde dói. Escrevi esse texto a fim de transmitir um pouco desse sentimento, fazer com que pessoas sintam, relembrem ou talvez até se emocionem , porque não?. O intuito era demonstrar a importância dessas experiências na minha formação como pessoa, o quão relevante eram esses encontros e trocas de ideia, os conselhos aprendidos e passados, as risadas, as tristezas, momentos que não voltam, mas garanto que eternizados dentro de nossos corações, o que apenas restou foi saudade.
Gamertags
XBOX: MaRaNhO
PLAYSTATION: MaRaNhO_BR, MaRaNhO123
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